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Precisamos Deixar as Crianças Fazerem Dez Vezes a Mesma Coisa?

Todos nós, já passamos por isso: olhamos nosso filho, e ele está lá lavando as mãos. Quinze minutos depois vamos procurar, e ele esta lá. Ainda! Se prestarmos atenção, perceberemos que ele também repete dezenas de vezes outras coisas: colocar e tirar as meias, subir e descer as escadas… Repete tudo! Por quê?

Ele está aprendendo, claro. Mas parece ser mais do que isso. Mesmo quando ele já coloca as meias com toda a facilidade, continua repetindo. Precisa haver mais fatores em jogo, além do aprendizado. E há mesmo. Pelo menos três, que podem mudar a forma como vemos cada ação de nossos filhos:

1. Aprendizado: Sim, ele está acontecendo. Mas não só como a gente imagina. A gente imagina o aprendizado assim:

Mas ele é mais parecido com isso:

Se você aprendeu uma língua, um instrumento musical, ou qualquer coisa nova e difícil nos últimos tempos, passou por um caminho parecido com o segundo, e não com o primeiro. As crianças precisam aprender todas as coisas da vida, e passam pelo segundo caminho todos os dias, várias vezes. Repetir é a única forma de aprender.

2 – Superar Frustrações – Quando estamos nas partes difíceis do aprendizado, nós só sabemos que não sabemos. E isso não é sempre tranqüilo. Reconhecer a própria ignorância e as dificuldades que ainda estão pela frente pode ser desanimador. Tudo que o que vemos, às vezes, é um abismo de incertezas.

Falta coragem para continuar se a criança não puder confiar no que vem depois. Se a criança só puder fazer as coisas duas ou três vezes, o caminho dela é assim:

Tudo acaba na frustração. E se isso acontecer vezes suficientes, a criança aprenderá que todo começo de aprendizado só tem um fim: a frustração. Por outro lado, se permitirmos que a criança repita quantas vezes quiser, ela atravessa vários períodos de frustração, mas o fim do caminho é a conquista de um novo conhecimento ou uma nova habilidade. A frustração deixa de ser aterrorizante, ela passa a valer a pena.

3. Fluxo – Quando mergulhamos no processo de aprendizado ou descoberta de forma profunda o suficiente, em algum momento esquecemos de nós mesmos e nos entregamos ao que estamos fazendo. Esquecemos da fome e da sede, do corpo e das necessidades dele, de tudo que está em volta e de tudo o que precisaremos fazer mais tarde. Só existe aquilo que estamos fazendo.

Esse estado de entrega e concentração profunda foi descoberto por Mihaly Csikszentmihalyi, psicólogo húngaro, e ele também descobriu que o Fluxo está diretamente relacionado, não só com aprendizado de alta qualidade, mas também com níveis muito bons de bem-estar, serenidade e motivação.

Quando as crianças já sabem fazer o que estão fazendo, e mesmo assim continuam, estão aperfeiçoando alguma coisa invisível para nós. Pode ser que já saibam lavar as mãos, mas ainda estejam desenvolvendo a capacidade de superar a frustração, ainda estejam aprofundando a concentração, e ainda estejam aprendendo a entrar em estado de fluxo. Tem muita coisa que nós não podemos ver.

Quando seu filho estiver na décima segunda repetição da mesma coisa, deixe continuar. Ele pode já ter construído o aprendizado. Agora, está na segunda parte: a construção de um ser humano.

Gabriel Salomão

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