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Montessori e o Movimento na Formação da Personalidade

Você já reparou que as crianças ficam mais tranqüilas quando podem se movimentar à vontade? Isso não tem a ver só com “gastar energia”. Nem sempre essas crianças ficam mais cansadas. Elas ficam mais em paz. E na infância, ficar em paz é um sintoma de que as necessidades do desenvolvimento estão sendo atendidas.

Quando pensamos na formação da inteligência da criança, pensamos em estímulos e oportunidades para ver, ouvir e pensar sobre coisas interessantes. A inteligência e o corpo, na maior parte do tempo, estão completamente desligados na visão de mundo do adulto.

Maria Montessori lembra que usamos expressões como “flor” e “anjo” para falarmos de crianças. Ela ainda nos lembra que flores são imóveis e que o vôo dos anjos acontece em um outro mundo, sem incomodar os adultos.

Quando mostramos qualquer coisa interessante à criança: a figura de um cachorro ou o cheiro de uma flor, nossa expectativa não é que ela veja ou cheire. Mas que a visão da imagem ou o aroma da flor formem uma impressão na sua mente, e que ela aprenda a reconhecer essas coisas, ou a beleza delas.

“Ver e ouvir”, diz Montessori, “não têm a menor importância, mas, vendo e ouvindo, a personalidade do eu se forma, se mantém, goza e se desenvolve”. Ela, em seguida, adiciona: o mesmo se pode dizer do movimento. “O problema fundamental da vida humana, e, portanto, da educação, é que o eu consiga animar e tomar posse de seus próprios instrumentos motores”.

Montessori está nos dizendo que o objetivo mais importante da vida humana na primeira infância é controlar os movimentos com a inteligência. Isso não é simples nem é pouco.

Poucas semanas depois de nascida, a criança começa a tentar dominar seus movimentos, e nós deixamos que ela faça isso livremente, enquanto fica deitada, sem conseguir se sentar. Mas a partir do momento que a criança anda, nós a impedimos de executar seus movimentos com liberdade. Temos medo, por ela e por nossos objetos, e deixamos que esse medo seja um obstáculo ao seu desenvolvimento.

O medo funciona como uma enorme pedra no meio de um rio. O corpo e a inteligência da criança vêm caminhando juntos: a inteligência comandando o que o corpo executa, e o corpo oferecendo à inteligência um mecanismo perfeito para compreender o mundo. E então esse fluxo encontra o medo do adulto. O obstáculo força o fluxo a se separar.

Para um lado vai o corpo, sem um mente para o comandar. Para outro, a mente, sem ter quem execute suas ordens e alcance o mundo para ela. O que ocorre é que os movimentos da criança ficam descontrolados, e na melhor das hipóteses, seu emocional fica instável. Porque a criança não aceita essa separação e sabe que precisa retomar seu desenvolvimento, ela entra em embates freqüentes com o adulto, ficando exausta, mais instável emocionalmente e com movimentos cada vez mais aleatórios.

Se formos capazes de oferecer a ela a chance de provocar o reencontro da inteligência e do movimento, ela faz isso. Para ajudar, podemos fazer convites: abrir buracos na terra para plantar, pendurar roupas no varal ou lavar a porta do box com água. Atividades atrativas para a criança vão trazer sua atenção para o movimento, e vão permitir o reencontro da mente com o corpo.

Você perceberá primeiro uma sutil melhora, e depois uma firme recuperação, do controle físico e da estabilidade emocional das crianças. Isso é a criança livre para criar a si mesma, em ação. Quando isso ocorre, o equilíbrio se instala, e o eu tem chances de se formar em paz.

Gabriel Salomão

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