Montessori em Pauta
Como Fazer Escolhas afeta o
Desenvolvimento das Crianças
J. tinha menos de dois anos, e já eram duas da madrugada. Todos estavam dormindo, mas a mãe dele ouviu um barulho no corredor e foi dar uma olhada. J. tinha saído do quarto e estava andando na direção da sala. A mãe decidiu não interromper. Ele foi até a cozinha. A mãe sem interromper. Ele abriu o armário e pegou um copo. A mãe se segurou. Ele encheu o copo d’água, bebeu, colocou o copo na pia e se virou para voltar. A mãe se escondeu. Ele voltou, deitou-se e dormiu de novo. A mãe, feliz porque não tinha interrompido nada, entendeu que as crianças podem mais do que nós imaginamos, mesmo às duas da madrugada.
Cem anos atrás, quando começava a primeira escola de Maria Montessori, ela também tinha dúvidas sobre as crianças, e por isso os materiais ficavam fechados num armário e eram entregues pela professora aos alunos. Mas um dia ela chegou atrasada, e os alunos haviam aberto o armário e, com a ajuda de uma cadeira, acessaram todos os materiais, os escolheram livremente, e começaram a trabalhar.
Foram as crianças que mostraram que elas mesmas precisavam de liberdade de escolha para alcançarem um bom desenvolvimento.
Não poderia ter vindo de um adulto. A idéia, o princípio mesmo, de que o adulto devesse se retirar para dar lugar à criança, nunca poderia ter vindo do adulto.
Hoje, a idéia de que devemos respeitar as escolhas das crianças, e a habilidade delas de fazer escolhas e lidar com as conseqüências, é uma noção mais comum. Mas por que devemos fazer isso? O que acontece com o desenvolvimento das crianças quando elas podem escolher?
1. Desempenho
Estudos realizados nos últimos quarenta anos apontam que crianças (e até mesmo adultos!) que podem fazer escolhas durante a realização de uma tarefa costumam ter resultados muito melhores no que fazem. Faz sentido, não é? Se podemos controlar até mesmo coisas mínimas, como o lugar onde vamos trabalhar, isso influencia bastante nosso desempenho.
2. Persistência
Pode parecer inacreditável, mas quando uma criança escolhe uma atividade, é capaz de permanecer nela por até quatro vezes mais tempo do que uma criança que faz a mesma atividade, mas sem escolher – é a diferença entre 15 minutinhos e uma hora inteira de esforço e concentração.
3. Motivação
Nesse caso, nem é necessário apresentar um estudo (embora ele exista). Quem escolhe o que vai fazer se dedica com mais vontade. Se outra pessoa escolhe por nós, somos até capazes de fazer, mas a vontade é muito menor, e talvez por isso o impacto sobre a persistência e o desempenho seja tão grande.
4. Felicidade
Desde a infância até a idade adulta, explica a psicóloga cognitiva Angeline Lillard, a sensação de controle sobre o ambiente tem efeitos positivos sobre o bem estar humano, enquanto que a falta desse controle tem efeitos negativos. E isso é verdadeiro tanto para a casa quanto para a escola. Se queremos que nossos filhos sejam felizes, devemos oferecer a oportunidade de fazerem boas escolhas.
5. Menos problemas emocionais
Um estudo de 2018 mostrou que mesmo antes dos seis anos de idade é possível perceber que crianças que podem fazer mais escolhas, mesmo que tenham de lidar com conseqüências desagradáveis das escolhas que fazem, desenvolvem um equilíbrio e um controle emocional e social melhores. Na adolescência, uma vida inteira de escolhas e conseqüências, em vez de proteção e passividade, fazem toda a diferença, e influencia bastante o desempenho acadêmico e o comportamento dos adolescentes.
6. Consequências para a Vida Adulta
Um outro trabalho, este de 2016, encontrou uma relação importante entre a saúde física e o bem-estar de adultos e o estilo de criação que tiveram na infância. Adultos que foram criados de forma menos controladora, e com mais suporte para o desenvolvimento da autonomia, com permissão para fazerem escolhas e lidarem com as conseqüências delas, tornaram-se adultos mais felizes e mais saudáveis do que os do outro grupo.
Não faltam motivos para alimentarmos em nossas crianças a habilidade de fazer escolhas e o equilíbrio emocional para isso. Às vezes nos falta a disposição. A boa notícia, neste caso, é que quanto mais permitimos que as crianças façam escolhas (dentro das opções que são saudáveis para elas), melhores elas ficam nisso, e vai ficando mais e mais fácil para nós, adultos.
Podemos terminar com uma pergunta de Montessori: Você alguma vez deu ao seu filho, mesmo que só por um dia, a oportunidade de fazer o que ele quisesse, sem interferência? (Maria Montessori)
Gabriel Salomão
Crianças jogam coisas. O que fazer em seguida?
Precisamos aceitar que crianças jogam coisas. Temos vontade de resistir. Jogar parece errado. Jogar contraria o apego que sentimos pelos objetos, e parece agressivo e desnecessário. Mas e se jogar não fosse nada disso?
Todas as crianças jogam coisas. Não é o seu filho, nem o filho da sua vizinha que não sabe ser mãe. São todas as crianças. E para quase todas elas, jogar fica interessante entre um ano e meio e três anos. Todas jogam com a mesma vontade e pelos mesmos motivos. E agora, a boa notícia: todas elas podem aprender a não jogar da mesma forma.
O QUE FAZ COM QUE CRIANÇAS JOGUEM COISAS?
Há muitas causas em jogo. É bom começarmos lembrando de um fato sobre crianças: necessidades geram comportamentos, e comportamentos são sempre fruto de necessidades. Vale a pena lembrar disso sempre. Se nossos filhos estão jogando as coisas, tem motivo, e o motivo é uma necessidade que não foi satisfeita. Na verdade, duas.
Motivo nº1
As crianças podem estar com fome, com sono, frustradas ou muito chateadas. Mas adultos sentem tudo isso e não jogam coisas. Por que crianças sim?
A diferença, aqui, entre adultos e crianças, muito mais do que a capacidade cerebral de controlar o próprio comportamento, é a capacidade de falar com facilidade. Para os adultos, falar é fácil. Por isso, adultos irritados gritam, em vez de arremessar cadeiras. Não é que todos nós sejamos mestres da calma, mas nós temos como despejar nossa fúria pela boca.
Para as crianças, isso não é fácil. Elas não tem muito vocabulário, articular palavras é uma conquista recente, e frases são uma novidade que elas ainda estão tentando dominar. Então, o mal estar não tem válvula de escape verbal, e elas extravasam fisicamente. Nesse caso, a solução no momento é se abaixar e falar com a criança com muita calma. Com uma calma quase exagerada. Justamente porque ela está muito agitada e explosiva, nós precisamos ser poços de tranqüilidade e aceitação. Aceitação, não permissão. Podemos perguntar o que aconteceu, ou podemos dizer algo como: “Você está bravo. Você pode ficar bravo, eu entendo você. Você não pode jogar coisas. Mas podemos lavar o rosto (ou dar um abraço, ou tomar banho, ou o que ajuda seu filho a ficar bem). Vamos?”.
Motivo nº2
As crianças podem estar com vontade de jogar coisas. Pode ser simples desse jeito. Crianças têm fases para desenvolver habilidades: a fase de caminhar, a de escalar, a de subir e descer escadas, carregar coisas pesadas e… jogar.
Os primeiros três anos são um período muito intenso de desenvolvimento, de movimento, e jogar é um movimento.
Se a criança que convive com você está jogando coisas o tempo todo, mesmo quando parece bem, e o motivo claramente não é uma tempestade emocional, então ela joga por prazer. A solução aqui é mais fácil e mais divertida.
Você pode fazer uns saquinhos de areia, ou comprar bolinhas pesadas, e encher um cesto com eles. Depois, pode colocar um bambolê no chão ou colocar um outro cesto vazio a alguns centímetros (e depois alguns metros) do primeiro. Pronto. Agora você transformou jogar em um jogo. E as coisas vão melhorar.
Lembretes:
Tanto no primeiro caso quanto no segundo, as coisas não vão dar 100% de resultado da primeira vez. É, eu sei, eu também queria, mas não vão. Você vai precisar fazer algumas vezes seguidas. E nas situações em que sua criança estiver emocionalmente mal, você vai precisar descobrir a causa verdadeira do mal estar (a gente tem um passo a passo aqui) e arrumar isso. Mas uma vez que você coloque as soluções em prática, e as necessidades sejam atendidas, o comportamento se transforma. Isso é o que existe de incrível em comportamentos: eles podem mudar, se as necessidades forem atendidas.
Gabriel Salomão
O Milagre da Concentração
Não existe nada mais importante no desenvolvimento do que a atenção. Estar atento é saber que se está vivo. Quando a criança presta atenção a alguma coisa, o que acontece não é só que ela aprende a coisa, é que ela aprende a si mesma. Ela descobre que ela mesma existe, age, pensa e sente.
A concentração é o ponto mais importante da vida de qualquer ser humano. Mas para a criança isso é ainda mais verdade.
Quando as crianças nascem, são profundamente concentradas. É esse o brilho que vemos nos olhos do bebê que tenta segurar um bichinho de borracha bem à sua frente. Esse é o segredo da força da criança que cai e levanta dezenas de vezes por dia, sem desistir, quando está aprendendo a andar. A concentração é o milagre que gera força e vida na criança pequena.
As crianças perdem a capacidade de concentração conforme os anos passam, porque não têm mais liberdade para perseguir aquilo que é importante para seu eu interior. Um bebê pode passar horas tentando pegar e bater nas peças de um móbile. Mas nós não permitimos que uma criança de dois anos abra e feche todas as gavetas da casa, incluindo a cozinha, e nem permitimos que ela suba e desça as escadas quantas vezes e pelo tempo que quiser. Isso faz com que não valha mais a pena se concentrar, porque aquilo que é importante de verdade ela não pode fazer. Em Montessori, nós temos caminhos para ajudar a criança a chegar à concentração de novo. Não são caminhos rápidos, nem fáceis. Mas eles funcionam todas as vezes. Neste texto, você terá um passo a passo, menos específico do que o da escola, mas útil para integrar à sua vida com seu filho, e ajudá-lo a reencontrar a concentração perdida.
1. Dominar o corpo.
Ninguém se concentra com um corpo descontrolado. Nossa primeira tarefa com a criança é ajudá-la a perceber que ela tem um corpo, de novo. Andar com elas ajuda muito. Incentivar que se equilibrem em muretas, que carreguem objetos (mesmo os delicados) e que puxem suas próprias cadeiras, abram e fechem suas portas e gavetas, tudo isso ajuda o corpo a se controlar. E ajuda a criança a começar a voltar para si mesma.
2. Usar o corpo.
Uma vez que o corpo possa obedecer a criança, ele pode ser usado para trabalhar, para atividades com propósito, e é nessas atividades com propósito que a criança se envolve mais profundamente, e se concentra. Agora, o nosso papel se torna apresentar à criança as maneiras de usar a casa. Para nós, são tarefas domésticas. Mas para a criança são passos na conquista da independência, e descobertas fascinantes.
3. Mostre como se faz.
As crianças querem fazer as coisas, mas estão habituadas a serem proibidas, interrompidas e ajudadas. Mude as coisas. Não faça para a criança, mas mostre a ela como fazer. Mostre devagar, faça gestos lentos e cuidadosos, e quase não fale nada. O silêncio ajuda a criança a olhar para as suas mãos.
4. Convide a criança para fazer.
Depois de você mostrar, deixe muito claro que a criança pode fazer quando quiser, e então permita. Pode ser descascar tangeridas e bananas, e pode ser dobrar roupas limpas. Pode ser lavar as mãos ou lavar os pratos. Deixe claro que a criança pode fazer, de uma forma sedutora mesmo, para que ela queira experimentar.
5. Espere e assista
A criança, mais hora ou menos hora, vai experimentar o que você mostrou. Em muitos casos, não vai se concentrar de verdade. Mas aqui e ali, de vez em quando, você perceberá que ela está completamente entregue ao que está fazendo. Quando isso acontecer, não se aproxime. Não ajude, nem elogie. Não olhe muito, e nem sorria. Não faça nada que possa interromper a concentração, desapareça, para que a concentração possa surgir.
6. Responda da forma apropriada
Quando a criança terminar a atividade em que se concentrou, pode ser que chame você, e pode ser que não. Se ela chamar, vá ver, e se ela quiser comentários, descreva animadamente o que você está vendo que ela fez, e pergunte coisas a ela, sorrindo sempre. Mas se ela não chamar, não se aproxime. Ela não precisa da sua aprovação, pois ela mesma se aprovou no que fez, e entrou em contato com o melhor de si mesma.
7. Adote termômetros
Para sabermos se estamos fazendo as coisas certas com nossas crianças, existem duas perguntas: “Elas estão serenas e felizes?” é a primeira. E “Elas se concentram?” é a segunda. Se a criança é serena, feliz e concentrada, podemos ter certeza de que está tudo bem e, se continuar pelo mesmo caminho, vai ficar tudo cada vez melhor. Por outro lado, se a criança não está serena, feliz, e não tem nenhuma concentração, é muito provável que experimentar este roteiro ajude muito você a criar uma educação para seus filhos mais apropriada, mais rica e mais profunda em experiências do dia a dia.
A concentração não é pouca coisa. Não é uma habilidade que uns têm e outros não. A concentração é o ser humano entrando em contato consigo, é a experiência mais profunda que a criança pode viver, e é uma experiência que transforma a maneira como a criança vive a vida, e a ajuda a alcançar um belíssimo equilíbrio interior. Este roteiro, sintético e prático, vai ajudar você a tornar a concentração um hábito em sua casa. Não tenha pressa, e não apresse. A concentração é sempre espontânea, vem sozinha, se as condições estiverem corretas. Nosso trabalho é preparar o terreno, e então assistir e esperar.
Gabriel Salomão
As Crianças Precisam dos Estímulos mais Delicados
Depois de crescidos, o céu azul é o céu de todo dia. Mas quando nós estamos vendo o céu azul pelas primeiras vezes, ele é cheio de novidades. Nada é “de todo dia” na primeira infância. Tudo é novo, e interessante. Cada detalhe importa.
Nós nos acostumamos a pensar que sons agudos e altos, cores fortes e brilhantes, chamam a atenção das crianças, e que crianças gostam dessas coisas. Mas cores fortes e sons altos chamam a atenção de qualquer pessoa. As crianças, que ainda estão aprendendo a identificar o que é importante e o que não é, prestam atenção ao que é agudo e brilhante, porque é um estímulo mais forte que os outros. Mas elas não gostam dessas coisas.
Elas, como nós, gostam da delicadeza.
Uma criança de dois anos pode, e talvez o seu filho já tenha feito isso, parar no meio de uma caminhada para acompanhar um inseto na parede, ou para ver uma plantinha escapando de uma rachadura no chão. Isso é importante para ela. Não é alto, nem agudo, nem brilhante. Mas importa. Ela se alimenta das pequenas coisas do mundo, e com essas pequenas coisas ela faz uma coisa grande: o ser humano que ela será um dia.
É uma escolha de educação se vamos oferecer só as coisas brilhantes e fortes e altas para as crianças, ou se vamos privilegiar as delicadas. As crianças preferem as delicadas.
As coisas delicadas nos alimentam, mas também nos descansam. Ninguém fica exausto porque viu muitas flores. Ninguém sente dor de cabeça porque ouviu muito os passarinhos cantando nas árvores. As crianças gostam das flores e dos passarinhos, como gostam das batatas na sua fruteira e do cheiro que fica no banheiro depois que alguém toma um banho quente. Elas percebem essas coisas, e dizem: “Hum! Que cheiroso!”. Isso é uma criança fascinada, impressionada, estimulada.
Na comparação entre a suavidade do aroma de shampoo que fica no vapor do banheiro depois do banho, e as imagens fortes, rápidas e extremamente coloridas de um desenho animado, o que nós temos é, de um lado, a delicadeza, e do outro, um estímulo rude e mal acabado. Quase uma indelicadeza, mesmo.
Nesse sentido, é indelicado com nossas crianças entregar a elas estímulos tão fortes, quando elas sabem apreciar, até mais do que nós, os mais suaves.
Quando morávamos em um apartamento, às vezes meu filho me chamava para ver o pôr do sol. Eu podia estar ocupado, com trabalho, louça ou… trabalho. Mas ele me chamava e eu ia rápido, porque se demorasse, eu ouvia: “Ah, agora mudou”. Porque o pôr do sol é rápido assim. E as crianças são assim sensíveis.
A gente pode viver na delicadeza. Aproveitar o cheiro gostoso do manjericão recém cortado, o barulho da chuva nas telhas e o do vento nas frestas das janelas, as cores do pôr do sol e o jogo de luz e sombra assim que amanhece. O mundo todo é cheio de estímulos, o mundo todo é uma festa, se a gente prestar atenção, e as crianças prestam atenção. Elas não precisam dos nossos estímulos artificiais o tempo todo, das nossas buzinas, os nossos gritos, as nossas explosões. Elas precisam da outra coisa: o nosso silêncio, a nossa paciência, a nossa espera, e a nossa sensibilidade e presença para notar essas pequenas coisas, esses milhares de pequenas coisas, que formam o mundo inteiro.
Gabriel Salomão
Ajude-me a fazer sozinho
Muitas pessoas ficam surpresas quando visitam uma sala de aula Montessori. Elas vêem crianças alegremente realizando seu trabalho, às vezes por longos períodos de tempo, sem qualquer sinal de tédio ou exaustão. Os visitantes às vezes perguntam: “Qual é o segredo? Por que eles estão trabalhando com tanta alegria e cooperatividade? O Método Montessori baseia-se em alguns princípios fundamentais, incluindo: respeito pela criança, liberdade dentro dos limites e promoção da independência e da unidade social.
Um princípio abrangente da filosofia Montessori é a liberdade. Na sala de aula, a cada criança é dada tanta liberdade quanto ela possa lidar. A liberdade, no ambiente Montessorianos, é equilibrada com diretrizes de comportamento claras, consistentes e razoáveis. Quando as crianças experimentam a liberdade para se mover, conversar, escolher suas atividades, etc., elas ganham independência. Dessa forma, os pequenos desenvolvem atitudes cada vez mais independentes, sua verdadeira natureza brilha, e eles freqüentemente exibem traços de caráter positivos, tais como: confiança, alegria, coragem, determinação e curiosidade.
Como adultos, podemos oferecer oportunidades para as crianças expressarem sua crescente independência. Às vezes, isso pode ser tão simples quanto dar tempo e espaço para a criança descobrir uma idéia ou resolver um problema por conta própria. Para pais e professores Montessorianos, pode ser bastante desafiador aceitar incondicionalmente o trabalho de uma criança (tentativas, falhas, etc.) sem corrigir. É importante lembrar que a criança está aprendendo e naturalmente aperfeiçoará suas habilidades ao longo do tempo.
Abaixo listamos algumas tarefas significativas que mesmo as crianças pequenas podem fazer de maneira independente em casa:
Vestir-se
Para ajudar a criança a se vestir, é melhor fornecer apenas algumas opções de roupas de cada vez. As peças podem ser armazenadas em uma cômoda ou prateleira baixa que a criança possa acessar com facilidade. Ao escolher roupas, é melhor selecionar itens que a criança possa colocar sozinha sem muita complicação.
Cuidar-se
Crianças pequenas muitas vezes gostam de realizar suas próprias rotinas de higiene, incluindo: escovar os dentes e cabelos, lavar o rosto e as mãos, assuar os narizes, aplicar loção e protetor labial, etc. Os adultos podem mostrar como usar objetos e produtos para higiene pessoal utilizando-os em si mesmos.
Preparar um lanche ou refeição
Com um pouco de orientação, as crianças pequenas podem preparar lanches simples e saudáveis para si mesmas. Algumas idéias incluem: ovos cozidos, biscoitos com cream cheese ou geléias, iogurte, frutas fatiadas, smoothies, e muito mais! Receitas de cozimento simples são sempre um sucesso também!
Cuidar do lar e da limpeza
Varrer, dobrar toalhas, manusear o aspirador de pó, entre outras, são tarefas que seu filho pode fazer sozinho! As crianças pequenas normalmente têm bastante interesse em participar das tarefas domésticas do dia a dia. Elas também podem regar plantas, cuidar do jardim, dos animais de estimação da família, lavar pratos e outras atividades domésticas comuns. Em uma sala de aula Montessori, você verá crianças cuidando de si e de sua sala de aula. Essas atividades são profundamente significativas para o desenvolvimento físico, intelectual e emocional da criança. Não forçamos as crianças a participar dessas tarefas, de modo que elas não sejam chamadas de tarefas na sala de aula. As crianças são convidadas a participar e mostramos uma maneira simples de realizar a tarefa. Quando as crianças se envolvem em atividades significativas e interessantes, elas naturalmente experimentam a alegria do trabalho.
Gabriel Salomão
Porque Devemos Caminhar com Nossos Filhos
As crianças gostam de caminhar, e adoram caminhar conosco. Nós nem sempre percebemos como as caminhadas que fazemos juntos são preciosas, e como guardam chances de momentos lindos e futuras memórias de amor. Caminhar junto pode ser o único momento sem distrações eletrônicas que temos com nossas crianças e pode ser a hora do dia em que nossos filhos abram seus pequenos corações, e nos falem de sua vida e suas descobertas.
Especialmente a partir dos dois anos, as crianças adoram uma boa caminhada. Foi nessa idade que eu comecei a caminhar com meu filho, e a testemunhar sua alegria quando podia, sem pressa, subir e descer dos degraus, correr pelas rampas e pular nos desníveis da calçada. Hoje, quando caminhamos juntos, eu escuto sobre os amigos da escola e o que lhe agrada e revolta, e que ele não diz quando estamos parados ou ocupados com nossos afazeres domésticos.
Montessori nos ensina a caminhar com nossos filhos:
[a criança] caminha com uma finalidade totalmente diferente da nossa. O adulto anda para chegar a uma meta externa e segue diretamente para ela; além disso, tem no passo um ritmo já estabelecido, que o transporta quase mecanicamente. A criança anda para elaborar suas próprias funções e, portanto, tem um objetivo criativo por natureza. É lenta e ainda não possui um ritmo de passadas ou uma finalidade. Sente-se, porém, atraída pelas coisas e abrir mão de seu próprio ritmo, de sua meta. – Maria Montessori, em A Criança
Caminhar devagar, desviar do caminho, se perder um pouco do destino, esquecer o que viemos fazer na rua… e achar a rua, achar o caminho, nas pegadas de nossos filhos, nos passos da criança. Essa talvez seja uma das formas belas de cumprir a sugestão de Maria Montessori: “Siga a criança”. Ao caminhar junto, nós podemos seguir.
Quando caminhamos com nossos filhos, não caminhamos para chegar. Então esperar é possível, sentar-se na calçada para olhar qualquer coisa no chão é permitido. Encostar na parede enquanto eles sobem e descem nas rampas e nas escadas das casas é permitido. Correr é permitido. E andar muito devagar também é.
O que vale é a mágica.
E ai, depois de alguns metros, se nossos filhos são um pouco maiores, quatro, cinco anos, eles começam a falar, e nós podemos conhecer o que era escondido pelo correr da vida. Contam do que gostam e o que lhes alegra, falam dos desgostos e das tristezas, e perguntam muito. Perguntam sem fim. Mais do que responder, essa pode ser nossa chance de conversar.
Nós talvez tenhamos nos habituado a observar as crianças e aprender com seu comportamento. Mas aí temos outra chance: ouvir a criança e aprender com suas histórias. Descobrir seus interesses se torna possível, porque elas param para uma flor, um inseto, um carro, uma pessoa.
Caminhar abre caminhos. Caminhos para a convivência, o afeto, a comunhão e a união mais profunda entre pais e filhos. Mas para isso precisamos caminhar para caminhar. Não para chegar. O que vale é o passo que estamos dando, nas pegadas de nossos filhos. Seguindo a criança – ainda que ao seu lado. Seguindo a criança, como quem segue a primeira estrela, nós vamos conhecer a verdade da vida, e ela nos libertará – a nós e nossos filhos.
Gabriel Salomão
Só quem vive bem os agostos
é merecedor da primavera!
Lembro-me bem! Foi quando julho se foi, que um vento mais gelado, mais destemperado, que arrastava ainda folhas deixadas pelo outono, me disse algumas verdades. Convenceu-me de que o céu começaria a apresentar metamorfoses avermelhadas. Que a poeira levantada por ele daria lições de que as coisas nem sempre ficam no mesmo lugar e que é preciso aceitar que a poeira só assenta depois que os redemoinhos se vão.
Foi quando julho se foi que a minha solidão me convidou para uma conversa. E me contou de tempo de esperas. E me disse que o barulho das árvores tinha algo a dizer sobre aceitação. E eu fiquei pensando como elas, as árvores, aceitam as estações que, se as estremecem, também lhes florescem os galhos. Mas tudo a seu tempo. Foi em agosto que descobri que os cachorros loucos são, na verdade, os uivos que não lançamos ao vento. São nossos estremecimentos particulares que a nossa rigidez de certezas não nos permite encarar.
O mês de agosto tem muito a ensinar. Porque agosto é mês jardineiro, é dentro dele, berço do inverno, que as sementes dormem. Aguardam seu tempo de brotar. Agosto é guardador da boa-nova, preparador de flores. Agosto é quando Deus deixa a natureza traduzir visivelmente o tempo das mutações.
Mude, diz agosto, em seu recado de sementes. Aceite, diz agosto, com seu jeito frio de vento que levanta poeira e a faz avermelhar o céu. Compartilhe, diz agosto. Agasalhos, sopas quentinhas, cafés com chocolate, abraços mais apertados – eles também aquecem a alma e aninham o corpo. Distribua mais afetos, que inverno é acolhimento, é tempo de preparar setembro. E, de setembro, todos sabemos o que esperar. Esperamos a arrebentação das cores, que com seus mais variados nomes vêm em forma de flores.
Vamos apreciar agosto, recebê-lo com o espanto feliz de quem não desafia ventos. Que ele desarrume e espalhe suas folhas e levante suas poeiras.
Aceite as esperas, mas coloque floreiras na janela.
Só quem vive bem os agostos é merecedor da primavera!
Miryan Lucy de Rezende
Precisamos Deixar as Crianças
Fazerem Dez Vezes a Mesma Coisa?
Todos nós, já passamos por isso: olhamos nosso filho, e ele está lá lavando as mãos. Quinze minutos depois vamos procurar, e ele esta lá. Ainda! Se prestarmos atenção, perceberemos que ele também repete dezenas de vezes outras coisas: colocar e tirar as meias, subir e descer as escadas… Repete tudo! Por quê?
Ele está aprendendo, claro. Mas parece ser mais do que isso. Mesmo quando ele já coloca as meias com toda a facilidade, continua repetindo. Precisa haver mais fatores em jogo, além do aprendizado. E há mesmo. Pelo menos três, que podem mudar a forma como vemos cada ação de nossos filhos:
1. Aprendizado: Sim, ele está acontecendo. Mas não só como a gente imagina. A gente imagina o aprendizado assim:
Mas ele é mais parecido com isso:
Se você aprendeu uma língua, um instrumento musical, ou qualquer coisa nova e difícil nos últimos tempos, passou por um caminho parecido com o segundo, e não com o primeiro. As crianças precisam aprender todas as coisas da vida, e passam pelo segundo caminho todos os dias, várias vezes. Repetir é a única forma de aprender.
2 – Superar Frustrações – Quando estamos nas partes difíceis do aprendizado, nós só sabemos que não sabemos. E isso não é sempre tranqüilo. Reconhecer a própria ignorância e as dificuldades que ainda estão pela frente pode ser desanimador. Tudo que o que vemos, às vezes, é um abismo de incertezas.
Falta coragem para continuar se a criança não puder confiar no que vem depois. Se a criança só puder fazer as coisas duas ou três vezes, o caminho dela é assim:
Tudo acaba na frustração. E se isso acontecer vezes suficientes, a criança aprenderá que todo começo de aprendizado só tem um fim: a frustração. Por outro lado, se permitirmos que a criança repita quantas vezes quiser, ela atravessa vários períodos de frustração, mas o fim do caminho é a conquista de um novo conhecimento ou uma nova habilidade. A frustração deixa de ser aterrorizante, ela passa a valer a pena.
3. Fluxo – Quando mergulhamos no processo de aprendizado ou descoberta de forma profunda o suficiente, em algum momento esquecemos de nós mesmos e nos entregamos ao que estamos fazendo. Esquecemos da fome e da sede, do corpo e das necessidades dele, de tudo que está em volta e de tudo o que precisaremos fazer mais tarde. Só existe aquilo que estamos fazendo.
Esse estado de entrega e concentração profunda foi descoberto por Mihaly Csikszentmihalyi, psicólogo húngaro, e ele também descobriu que o Fluxo está diretamente relacionado, não só com aprendizado de alta qualidade, mas também com níveis muito bons de bem-estar, serenidade e motivação.
Quando as crianças já sabem fazer o que estão fazendo, e mesmo assim continuam, estão aperfeiçoando alguma coisa invisível para nós. Pode ser que já saibam lavar as mãos, mas ainda estejam desenvolvendo a capacidade de superar a frustração, ainda estejam aprofundando a concentração, e ainda estejam aprendendo a entrar em estado de fluxo. Tem muita coisa que nós não podemos ver.
Quando seu filho estiver na décima segunda repetição da mesma coisa, deixe continuar. Ele pode já ter construído o aprendizado. Agora, está na segunda parte: a construção de um ser humano.
Gabriel Salomão
A Alfabetização do Silêncio
O som. Nós somos apaixonados pelo som. Falamos e ouvimos o tempo todo. Quase não vivemos sem música e ruído. Interrompemos as brincadeiras silenciosas de nossas crianças com nossas palavras e quando alguém está em silêncio perguntamos: No que você está pensando? Está tudo bem?
No som, temos segurança. Na ausência dele, sentimos perigo. Mas o som não é tudo o que há. Há o seu avesso. E se o som é infinito e são possíveis infinitas combinações de ruídos e notas musicais, também é assim no silêncio.
Há o silêncio da concentração, o da alegria imensa, o da serenidade contente, o da tristeza, o da saudade, há o silêncio de quem não sabe o que dizer e de quem não pode dizer o que sabe, há o silêncio finalmente alcançado e o silêncio forçado sobre nós. Há milhões e milhões de silêncios, como há milhões e milhões de palavras. Então, assim como existe uma alfabetização das palavras, um vocabulário sonoro, deve haver um vocabulário silencioso e uma alfabetização do silêncio.
Quase não existe saída, o barulho está em toda parte. O barulho vem de fora de nós, da TV, dos celulares, das vozes, e de dentro de nós, do pensamento que nunca pára, da nossa eterna playlist interior. Quase não dedicamos tempo a nos alfabetizarmos sobre o silêncio. Isso prejudica nossas relações com os outros e conosco, interfere na nossa paz e cria rachaduras na nossa consciência do que está acontecendo agora.
O silêncio pode ser duas coisas principais:
Primeiro, o silêncio pode ser a ausência do som. Esse é só um primeiro e pobre passo. Pode ser forçado, e aí é triste. Existe o silêncio do que é proibido dizer. Às vezes um olhar nos cala, um sinal de mão, uma cotucada, uma ameaça, um medo.
Então, vamos chamar esse primeiro de silêncio do medo. O silêncio do medo aparece quando não falamos porque alguma coisa externa ou interna pode acontecer. Nós, se falarmos, teremos de enfrentar monstros dentro ou fora de nós.
Nossas crianças habitam o silêncio do medo com mais freqüência do que deveriam. Não falam porque mandamos que calem, ou porque temem reprimenda. Esse é o silêncio pai da mentira. Primeiro nada se diz, e depois nesse silêncio venenoso tudo se transforma, a realidade assume uma forma menos ameaçadora, e a mentira nasce. Esse silêncio deforma a linguagem, que deveria expressar a maior verdade de nós mesmos, e passa a expressar o que os outros querem ouvir. O silêncio do medo é perigoso. Mas existe algo mais perigoso que ele.
O silêncio do medo muitas vezes se esconde debaixo de uma camada de sons. Desenhos animados, joguinhos, música demais, séries de TV, conversas artificiais. E aí não precisamos falar aquilo e vamos falando outras coisas. Até ter que olhar o silêncio do medo, e usar algum artifício para dormir rápido.
Felizmente, o silêncio do medo tem um irmão. Um irmão protetor, maior que ele, que pode cuidar dele. Um irmão infinito. Claro, ele é o silêncio da coragem.
O silêncio da coragem é selvagem. Nunca sabemos o que vai sair dele. É nele que habitamos quando, um instante antes de convidar o filho para o banho de esguicho, já nos alegramos com a transgressão. Quando, logo antes de um abraço, já nos alegramos com o carinho. O silêncio da coragem é a selva que nós somos antes de domesticarmos tudo para falar.
As nossas crianças podem habitar também esse silêncio. Quando ficam em sua brincadeira até terminarem, sem nenhuma interrupção. Quando descobrem um bicho no jardim e não nos tem aos ombros perguntando o que foi que acharam. Quando sentem a água da pia nas mãos sem precisar fechar a torneira já. Quando estão tristes e podem ficar tristes até a tristeza fazer sentido e então, devagar, ir embora. Tudo isso é um imenso suspense. É estar no espaço vazio e imenso do agora, sem saber quando ele vai acabar.
O silêncio da coragem é o que dá origem às nossas palavras mais verdadeiras. As decisões importantes e corretas, as declarações profundas, os manifestos contundentes nascem todos do silêncio da coragem. Um silêncio selvagem que perde todo o seu potencial se for domesticado. Precisa ser selvagem, até que nós atravessemos a selva e possamos trazer um pouco dela – daquela imensidão da selva – para o dia-a-dia das nossas vidas. A criança faz isso o tempo todo, se nós deixarmos.
Precisamos aprender a ficar em silêncio, habitar com ele, ouvir a selva, ouvir o medo. Precisamos ajudar nossas crianças no processo de alfabetização também. Basicamente, nós só precisamos dar espaço, para elas irem e voltarem da selva. E permitir que elas tragam da sua selva o que quiserem. E não amedrontar.
A alfabetização no silêncio pode ser longa. Demora para a alfabetização virar fluência, proficiência. E tudo bem. Ser alfabetizado já é grande, e já ajuda a fazer sentido dos tipos de silêncio que habitamos. Uma vez que nos alfabetizamos no silêncio, é como aprender a ler: todo o mundo que não conhecíamos se revela. E nós vivemos com mais essa parte do mundo. E viver com mais um mundo é ter mais uma chance. Um mundo novo para as nossas relações, a nossa família, as nossas vontades e as nossas emoções.
É uma selva, algumas vezes. Em outras é uma luz iluminando de um jeito novo caminhos antigos, nos permitindo descobrir o caminho todo novamente. O silêncio é um dos caminhos mais belo e tranqüilo para a paz.
Gabriel Salomão
Montessori e o Movimento
na Formação da Personalidade
Você já reparou que as crianças ficam mais tranqüilas quando podem se movimentar à vontade? Isso não tem a ver só com “gastar energia”. Nem sempre essas crianças ficam mais cansadas. Elas ficam mais em paz. E na infância, ficar em paz é um sintoma de que as necessidades do desenvolvimento estão sendo atendidas.
Quando pensamos na formação da inteligência da criança, pensamos em estímulos e oportunidades para ver, ouvir e pensar sobre coisas interessantes. A inteligência e o corpo, na maior parte do tempo, estão completamente desligados na visão de mundo do adulto.
Maria Montessori lembra que usamos expressões como “flor” e “anjo” para falarmos de crianças. Ela ainda nos lembra que flores são imóveis e que o vôo dos anjos acontece em um outro mundo, sem incomodar os adultos.
Quando mostramos qualquer coisa interessante à criança: a figura de um cachorro ou o cheiro de uma flor, nossa expectativa não é que ela veja ou cheire. Mas que a visão da imagem ou o aroma da flor formem uma impressão na sua mente, e que ela aprenda a reconhecer essas coisas, ou a beleza delas.
“Ver e ouvir”, diz Montessori, “não têm a menor importância, mas, vendo e ouvindo, a personalidade do eu se forma, se mantém, goza e se desenvolve”. Ela, em seguida, adiciona: o mesmo se pode dizer do movimento. “O problema fundamental da vida humana, e, portanto, da educação, é que o eu consiga animar e tomar posse de seus próprios instrumentos motores”.
Montessori está nos dizendo que o objetivo mais importante da vida humana na primeira infância é controlar os movimentos com a inteligência. Isso não é simples nem é pouco.
Poucas semanas depois de nascida, a criança começa a tentar dominar seus movimentos, e nós deixamos que ela faça isso livremente, enquanto fica deitada, sem conseguir se sentar. Mas a partir do momento que a criança anda, nós a impedimos de executar seus movimentos com liberdade. Temos medo, por ela e por nossos objetos, e deixamos que esse medo seja um obstáculo ao seu desenvolvimento.
O medo funciona como uma enorme pedra no meio de um rio. O corpo e a inteligência da criança vêm caminhando juntos: a inteligência comandando o que o corpo executa, e o corpo oferecendo à inteligência um mecanismo perfeito para compreender o mundo. E então esse fluxo encontra o medo do adulto. O obstáculo força o fluxo a se separar.
Para um lado vai o corpo, sem um mente para o comandar. Para outro, a mente, sem ter quem execute suas ordens e alcance o mundo para ela. O que ocorre é que os movimentos da criança ficam descontrolados, e na melhor das hipóteses, seu emocional fica instável. Porque a criança não aceita essa separação e sabe que precisa retomar seu desenvolvimento, ela entra em embates freqüentes com o adulto, ficando exausta, mais instável emocionalmente e com movimentos cada vez mais aleatórios.
Se formos capazes de oferecer a ela a chance de provocar o reencontro da inteligência e do movimento, ela faz isso. Para ajudar, podemos fazer convites: abrir buracos na terra para plantar, pendurar roupas no varal ou lavar a porta do box com água. Atividades atrativas para a criança vão trazer sua atenção para o movimento, e vão permitir o reencontro da mente com o corpo.
Você perceberá primeiro uma sutil melhora, e depois uma firme recuperação, do controle físico e da estabilidade emocional das crianças. Isso é a criança livre para criar a si mesma, em ação. Quando isso ocorre, o equilíbrio se instala, e o eu tem chances de se formar em paz.
Gabriel Salomão
A Escola como Orientadora na Educação Alimentar e Nutricional
A escola Crescer tem como objetivo promover a saúde e o bem estar das crianças que frequentam nossa escola, e assim utilizamos e desenvolvemos nesse espaço a promoção de hábitos alimentares saudáveis.
Compreendemos que a formação dos hábitos alimentares é influenciada por fatores fisiológicos, psicológicos, socioculturais e econômicos e que têm sua formação iniciada na infância. Avaliamos também nesse contexto, hábito alimentar como um repertório de práticas alimentares que tendem a se repetir ao longo do tempo, e se frisa, nesse sentido, que é nessa fase da vida que o indivíduo sai do convívio basicamente familiar e penetra no contexto escolar, no qual experimentará outros alimentos e preparações e terá oportunidade de promover alterações nos seus hábitos alimentares pelas influências do grupo social e dos estímulos presentes no sistema educacional.
Hábitos Saudáveis
A infância é uma época de fundamental importância para estabelecer hábitos saudáveis. Uma alimentação saudável e a prática regular de atividade física só vão ser seguidas pela criança por toda a sua vida, se forem habituadas desde pequenas.
Montessori e a Alimentação
A abordagem Montessori, desenvolvida pela médica italiana Maria Montessori, é conhecida por seu foco na educação infantil baseada na autonomia e na aprendizagem através da exploração. Essa filosofia não se limita apenas à educação acadêmica, mas também se estende ao desenvolvimento de hábitos saudáveis, incluindo a alimentação. Introduzir o método Montessori clássico na alimentação desde a infância pode trazer inúmeros benefícios para as crianças, pais e cuidadores.
- Independência e Autonomia: O método Montessori valoriza a independência das crianças, permitindo que elas participem ativamente de suas atividades diárias. Na alimentação, isso se traduz em permitir que as crianças tenham uma alimentação mais independente, como por exemplo: com o uso de talheres. Isso promove a autoconfiança e o desenvolvimento de habilidades práticas.
- Respeito pelo Ambiente e pela Comida: O método Montessori enfatiza o respeito pelo ambiente e por tudo o que o rodeia. Isso inclui o respeito pelos alimentos. Quando as crianças são envolvidas no processo de escolha e preparação dos alimentos, desenvolvem um respeito mais profundo pela comida, pelo trabalho que envolve seu cultivo e preparação, e pelo desperdício.
- Desenvolvimento de Hábitos Alimentares Saudáveis: Ao permitir que as crianças tenham um papel ativo na sua alimentação, os pais e cuidadores podem influenciar positivamente o desenvolvimento de hábitos alimentares saudáveis desde cedo. As crianças são mais propensas a experimentar novos alimentos e a desenvolver preferências saudáveis quando são incentivadas a fazê-lo de forma independente.
- Conexão com a Natureza: A filosofia Montessori também valoriza a conexão das crianças com a natureza. Isso se estende à alimentação, onde as crianças podem aprender sobre de onde vêm os alimentos, como crescem e o impacto que têm no meio ambiente. Isso pode incentivar a escolha de alimentos mais sustentáveis e a compreensão da importância da preservação ambiental.
- Menos Estresse nas Refeições: Ao dar às crianças o controle sobre sua alimentação, as refeições podem se tornar momentos mais tranquilos e agradáveis. Menos pressão para comer determinados alimentos pode reduzir o estresse associado às refeições e promover uma relação mais saudável com a comida.
- Desenvolvimento de Habilidades Motoras e Cognitivas: Montessori enfatiza a importância do desenvolvimento das habilidades motoras finas e cognitivas. A preparação e manipulação de alimentos, como cortar, misturar e servir, ajuda no desenvolvimento dessas habilidades essenciais.
Em resumo, a abordagem Montessori na alimentação desde a infância oferece uma série de benefícios, incluindo a promoção da independência, o desenvolvimento de hábitos alimentares saudáveis e uma apreciação mais profunda pela comida e pela natureza. Encorajar as crianças a desempenhar um papel ativo na alimentação pode estabelecer as bases para uma vida de escolhas alimentares saudáveis e conscientes.
Porque Maria Montessori revolucionou
o ensino da educação infantil
Maria Montessori nasceu em 31 de agosto de 1870 na pequena cidade de Chiaravalle, no leste da Itália. Ela construiu sua história pessoal, intelectual e científica dedicando-se por mais de meio século ao estudo e à pesquisa do mais fundamental e difícil problema do homem: sua formação, pois considerava que só por meio dela seria possível agir diante de questões decisivas da vida – sua conservação e seu desenvolvimento.
Até sua morte em 6 de maio de 1952, então com 81 anos, viveu de maneira concreta e apaixonada a história de seu próprio tempo, imersa em sua luta e em sua conquista, concebendo e experimentando novas alternativas, contestando as tradições e os dogmas e lançando-se com coragem às novas necessidades e às novas perspectivas da Educação, da Criança e da Humanidade.
Metodologia
É importante lembrar que o enfoque da educação Montessori é sempre indireto e nunca direto, ao contrário da educação tradicional. O respeito da Dra. Montessori pela formação da criança, desde a sua concepção levaram-na ao cuidado de não interferir diretamente no seu desenvolvimento.
Filosofia
A filosofia Montessoriana deve ser reconhecida por ser um começo à busca de respostas para a educação e a vida da criança. Partindo de suas experiências e não das nossas, representa a base para a construção da educação do futuro.
Como o Comportamento dos Pais
Influencia a Personalidade dos Filhos
Nós desejamos que as crianças desenvolvam personalidades fortes e independentes, que sejam autônomas e conscientes em suas escolhas. E procuramos sempre as maneiras de educá-las que ajudem na construção dessa personalidade.
Existem comportamentos adultos que ajudam a criança a construir sua própria personalidade, e comportamentos que fazem com que a criança absorva a personalidade do adulto, em vez de formar a sua, e levam a uma substituição da personalidade, nas palavras de Montessori. Neste texto vamos entender como isso funciona.
O Amor pelo Ambiente
As crianças amam o ambiente em que vivem, não com um amor sentimental, mas com um amor psíquico. Elas absorvem o ambiente, formam-se a partir dele, e se formam para ele. As crianças prestam muita atenção ao ambiente e é no ambiente que elas encontram as pistas sobre o que devem fazer e como devem ser.
Por isso, aquilo que a criança encontra no ambiente é da maior importância. Ela vai usar tudo. Vai usar mais ainda se aquilo que ela encontrar vier das pessoas que ela mais ama no mundo: seus pais, ou os adultos responsáveis por ela.
A Substituição da Personalidade
Alguma influência dos pais sobre os filhos é inevitável. Eles falam nossa língua, acostumam-se à nossa comida, e escutam a música que nos agrada. Mas, a depender de nossas ações, eles podem absorver muito mais do que isso, e essa absorção não é sempre boa.
Em minha casa, minha família tinha muito medo de pessoas entrarem em nossa casa. Ladrões, criminosos de todo tipo. Esse medo de alguém entrar em casa (apesar dos poucos motivos que alguém teria para isso) nos levou a morar em casas muito bem trancadas e de muros muito altos. Isso nunca me impediu de ter pesadelos, que duraram décadas, envolvendo roubos, assaltos e assassinatos, sempre com alguém entrando em casa à noite.
Eu nunca fui de ter outros pesadelos (hoje em dia, eu sonho que perco vôos para os Cursos Montessori), mas esse pesadelo, de pessoas entrando em casa, e um tremor de corpo inteiro quando escuto qualquer som no meio de uma noite de trabalho… Isso é uma parte da minha herança emocional.
As crianças não herdam só a paixão por Beetles e por cravo nos doces. Elas levam a personalidade dos pais no pacote, se nós não tomamos cuidado.
Crianças muito pequenas deixam isso especialmente claro. Um dia a criança, com dois anos, vê a mãe colocando copos em cima da mesa, virados para baixo. Dois dias depois, ela encontra copos virados para cima na mesa e os vira para baixo, um a um. Não é só o gesto, mas a percepção de como o mundo deve ser que a criança herdou da mãe naquele instante. E é isso que ela herda sempre.
Como Ajudar Nossos Filhos a Terem a Própria Personalidade
É claro que teremos influência sobre nossos filhos. Voluntária e involuntariamente. E está tudo bem. O cuidado que devemos ter não é para excluir a influência completamente, mas para editar essa influência. Escolher um pouco melhor o que desejamos passar a diante.
A melhor maneira de fazer isso é reconhecer os nossos impulsos e emprestar consciência a eles. Em vez de agir e falar por puro impulso, prestar atenção, e agir por escolha, falar por escolha.
Nós podemos fazer uma lista dos nossos maiores medos, das nossas maiores vontades, daquilo que criticamos nos membros da nossa família, daquilo que elogiamos publicamente. Podemos listar nossos desejos, ambições, repulsas. E então nos conheceremos um pouco mais.
Podemos pedir a nossos cônjuges que nos digam quais traços e ações são típicas nossas. É o jeito como fechamos a porta do carro? A fala rápida e acelerada? A tolerância com o comportamento dos outros? E conheceremos mais um pouquinho.
Quando nos sentirmos muito felizes, ou muito tristes, ou muito temerosos, ou muito bravos, podemos tomar nota, mentalmente, do motivo de nossa mudança emocional. E saberemos mais de nós mesmos.
Aos poucos, esse processo de descoberta de si mesmo leva a um comportamento menos impulsivo, mais escolhido, mais consciente. Isso não quer dizer que ele seja menos natural. Ele só é seu de verdade, e não de um inconsciente que você não controla.
Além disso, é claro, há o mais importante: precisamos deixar nossos filhos existirem. Se eles gostam de flores, e nós de parafusos, precisamos parar na rua quando houver flores, e conversar sobre flores com eles. Se eles lavam as mãos muito devagar e fazendo muita espuma, é preciso permitir. Se gostam, nas últimas duas semanas, de passar minutos amarrando os tênis, isso é importante, e a formação de uma personalidade autônoma passa por ações autônomas.
Precisamos ficar mais em silêncio, agir menos e permitir mais. As crianças estão sempre atentas ao ambiente à sua volta, e é assim que colhem matéria-prima para a construção do eu. Mas o eu se constrói de verdade, não quando as crianças absorvem a matéria-prima, e sim quando elas agem, usando a matéria prima para a construção autônoma da personalidade. Maria Montessori descobriu os segredos da criança, e abriu caminho para uma convivência melhor e mais pacífica entre adultos e crianças.
Gabriel Salomão
Respeitar o Ritmo da Criança
A Lição de Michelangelo
Olhe para o seu filho. Levando um copo d’água até a boca pela primeira vez. Se ele for muito pequeno, recorde-se de quando ele conseguiu acertar um móbile com a mão pela primeira vez também. Lembre-se de como ele tentou de novo, e outra vez. Dos erros e acertos, e da vontade de continuar. Da lentidão, dos fracassos, das inúmeras tentativas. Tudo isso pode passar despercebido para um adulto. Mesmo para um adulto que ame. São mistérios da criança, e segredos que ela guarda.
A criança é apaixonada pelo insignificante. Nós nem sempre entendemos isso bem, e tentamos mostrar a ela o mais interessante. Ela tenta colocar as meias oito, nove vezes. Nós nos mordemos de pena, e colocamos as meias para ela. Ela reclama, chora. E nós explicamos que agora ela vai poder ir para o parquinho! Correr! Brincar! Ao nosso olhar, isso é tão mais interessante do que colocar as meias.
Mas a criança é apaixonada pelo insignificante. E ela é lenta no insignificante. Em lugar de abotoar logo sua camiseta, demora. Em vez de se pentear rápido, vai muito devagar. E quando termina, a linha na cabeça parece um labirinto. E nós, cheios de constrangimento porque nossa filha vai ser vista com os cabelos tortos, nos compadecemos e ajudamos, penteamos de novo. E ela reclama: “Eu já penteei” e nós somos gentis: “Eu sei, filha, eu estou só…” Só o quê? Corrigindo. Só acertando. Só deixando perfeito.
Mas a criança não é perfeita. Ela está no caminho da perfeição. E é apaixonada pelo caminho. Por cada passo dele.
Quando falamos de respeito ao ritmo da criança podemos entender isso como geralmente entendemos: cada criança tem um ritmo…
Mas existe um outro jeito, melhor, mais profundo, mais revolucionário.
A criança tem um ritmo completamente diferente do ritmo do adulto. E é essa diferença que precisa do máximo respeito.
A criança é lenta e excessivamente repetitiva. Esse é seu ritmo.
O adulto já sabe fazer as coisas, e agora ele só reproduz o que já sabe. Mas, ao contrário do que pensamos, a criança não está só aprendendo. Ela está criando. Um ser humano inteiro. Habilidade por habilidade. Abotoar, dar laço no sapato, levar o copo até a boca, acertar o móbile, abrir uma gaveta, comer. Ela está construindo cada habilidade. Fazendo as conexões cerebrais necessárias. Criando.
E, claro, o trabalho de criação do ser humano é mais longo, mais demorado e mais repetitivo do que o trabalho de reprodução.
Por um instante, pense no Davi, de Michelangelo.
Quando Michelangelo esculpia, a seu ver, ele não impunha uma forma a uma rocha. Ele libertava a estátua dos obstáculos que a impediam de aparecer. A criança faz a mesma coisa: liberta-se dos obstáculos que a impedem de ser um ser humano com plena capacidade de ação.
É muito mais fácil copiar Davi do que libertar Davi pela primeira vez. O ponto é que para a criança é sempre a primeira vez. Por isso ela é repetitiva, e lenta, e por isso ela se dedica com muito mais intensidade do que o adulto a tudo o que faz.
Nós temos mais facilidade em lidar com o descontrole da criança, a velocidade dela. Quando a criança é extremamente rápida, derruba coisas, e faz barulho, dizemos a nós mesmos: Crianças são assim. Mas quando a criança demora, repete, tenta de novo, fracassa, se esforça, nós não pensamos que Crianças são assim. Pensamos que ela precisa de ajuda.
Ela precisa. Mas a maior ajuda que a criança pode receber só pode vir de um adulto treinado na paciência.
Imagine o tédio, o desespero e a confusão de quem observasse Michelangelo dar as primeiras marteladas que libertariam Davi.
Agora, imagine o encanto de quem o viu dar as últimas marteladas.
Agora, imagine o encanto de um escultor treinado, que o visse dar as primeiras, e permanecesse lá, observando, em silêncio, até a última.
Esse é o adulto de que a criança precisa. Um que a deixe trabalhar em paz, libertando-se de cada obstáculo, até que esteja satisfeita. Um adulto que não a corrija, que espere mais, que permita a repetição, e que assista, em silêncio, paciência e reverência, ao enorme trabalho de criar um ser humano.
Criar um ser humano é muito mais difícil do que libertar Davi de um pedaço de rocha. O maior trabalho da humanidade é feito pelas menores mãos. Elas trabalham em outro ritmo. E é este ritmo que precisamos compreender e respeitar.
Gabriel Salomão
Como funciona o desenvolvimento
cognitivo de uma Criança?
Aqueles que trabalham com o método Montessori percebem os efeitos positivos desta metodologia diariamente. No cotidiano, os educadores observam como as habilidades motoras das crianças são fortalecidas, suas habilidades de raciocínio se tornam aguçadas e sua independência é constantemente estimulada pela interação diária com o ambiente.
Mas, podemos observar tudo isso e simplesmente não saber como o método Montessori alcança tais resultados. Seria apenas um feliz golpe de sorte que faz com que a metodologia Montessoriana promova o desenvolvimento do cérebro?
É mais do que apenas uma simples coincidência. O neuropsicólogo pediátrico, Steve Hughes, acredita que o método Montessori desencadeia funções cerebrais específicas que auxiliam muito o desenvolvimento cognitivo. Na verdade, ele se refere ao Montessori como “o método original de aprendizagem baseado no cérebro.
Em pesquisas posteriores, descobriu-se que os primeiros seis anos de vida são significativos para o cérebro se desenvolver completamente. Há novas pesquisas que coincidem com a descoberta de que a fundação de estruturas neurais nos lobos frontais do cérebro humano não está totalmente desenvolvida até aproximadamente os vinte e quatro anos de idade. Isso indica que o cérebro se desenvolve continuamente e que adultos e pais podem fazer algo para tornar essa experiência positiva. Para atingir este potencial pleno, o ser humano precisa de interação com o ambiente e experiências sensoriais.
Portanto, agora a questão é “como podemos ajudar as crianças a alcançar o potencial máximo do desenvolvimento do cérebro?” A educação Montessoriana propõe alguns fatores importantes para o ambiente educacional, mencionando ser importante:
que estimule todos os sentidos;
que tenha uma atmosfera livre de estresse;
que seja agradável e desafiador;
que permita a interação social;
que contemple uma dieta nutritiva;
que promova o desenvolvimento e dê à criança uma chance de avaliar os resultados de suas ações, sendo um participante ativo, em vez de um observador passivo.
Essa ideia se reflete no que Montessori percebe como um ambiente preparado e se relaciona com o fato de que o cérebro vem equipado para adquirir habilidades como a linguagem, porém, todo o seu crescimento e mudanças são provocados por estímulos externos.
Maria Montessori constatou em suas observações que na infância ocorriam períodos sensíveis para o aprendizado. Nestas fases evolutivas as crianças apresentam grande potencial de aprendizagem, razão pela qual a educação é essencial. Sendo assim, Montessori propunha que crianças com idade entre 0 e 11 anos devem explorar o ambiente ao seu redor com a maior autonomia possível. A autora acredita que o ambiente da criança deve ser um “microcosmo infantil”, os móveis de tamanho apropriado para as crianças, brinquedos que possibilitem o desenvolvimento cognitivo e a exploração dos sentidos.
No método Montessoriano, as mãos funcionam como instrumentos do cérebro:
“Com as mãos o ser humano concebe o seu entorno. Elas são as ferramentas executoras da inteligência. As mãos são criativas, podem produzir coisas. Os órgãos sensoriais e a capacidade de coordenação se desenvolvem através das atividades manuais”, considera Maria Montessori.
O que acontece é que o cérebro utiliza de recursos para o processamento dos estímulos sensoriais e as mãos são de extrema importância para o desenvolvimento infantil.
Mas, com base nas observações de Montessori, quais são as reais necessidades de uma criança ao longo de seus primeiros seis anos de vida?
É preciso considerar que nesta fase os diferentes aspectos do desenvolvimento intelectual, emocional e social da criança estão interligados. Por isso, o cérebro da criança se potencializa diante dos sentimentos de amor, segurança e proteção. Quando a criança recebe carinho e tem uma infância confortável, ela lida melhor com as situações de estresse na vida adulta.
Atividades sensoriais que trabalham a visão, o tato, o paladar, o olfato, a audição e os movimentos, são capazes de estimular as células nervosas, construindo conexões permanentes. E a neurociência confirma que as atividades físicas potencializam a memória e o aprendizado, pois reforçam a produção de células no hipocampo.
Aulas de Musicalização, leitura e todas as atividades que envolvem enriquecimento de vocabulário também são extremamente importantes, pois quanto maior for o vocabulário da criança, melhor será seu desenvolvimento na escola. É importante que os pais e educadores estejam atentos aos sinais da criança, seu ritmo de desenvolvimento, seu estado de espírito, e saibam que embora o desenvolvimento cerebral seja previsível, cada criança é única e merece atenção.
Uma casa receptiva para os filhos
Montessori não se resume à sala de aula. É perfeitamente possível trazer seus princípios para dentro de casa e isso pode ser uma ponte inestimável para reforçar o que a criança aprende na escola.
Incentivar a ordem, a independência e automotivação é fundamental para a abordagem Montessori. Na escola, as salas de aula cuidadosamente projetadas permitem que os alunos desenvolvam competência para cuidar de si mesmos e do ambiente ao redor. Você pode preparar sua casa de maneira semelhante. Definir um lugar para tudo permite com que as crianças saibam onde encontrar o que precisam e tenham um lugar para colocar as coisas quando elas terminam de usar. Um ambiente ordenado também tem menos distrações, permitindo que as crianças se concentrem no que estão fazendo. Para ajudar uma criança, devemos fornecer-lhe um ambiente que lhe permita desenvolver-se livremente.
Simplificar o ambiente doméstico permite que a criança entenda o que se espera dela.
Por exemplo, limitar as escolhas de brinquedos e colocar prateleiras abertas ao nível dos olhos da criança (em vez de caixas de brinquedos, onde os brinquedos são amontoados em pilhas) permite com que ela veja todas as suas possibilidades de escolha e retorne os objetos para os locais de onde retirou.
Os quartos merecem atenção ainda maior e devem estar livres de desordem, com lugares claramente destinados para descanso, autocuidado e vestimenta. Para nutrir independência e autoestima, a mobília deve ser acessível, do tamanho da criança. Por exemplo, um armário com peças limitadas permitirá que seu filho faça suas próprias escolhas de roupas e arrume-as de forma independente.
O quarto pode ser uma expressão da personalidade e dos interesses únicos do seu filho e você pode permitir que ele escolha sua própria arte e sua cor de tinta, de modo que se sinta orgulhoso de cuidar de seu próprio espaço. Todas as áreas do quarto devem dar oportunidades para reforçar o valor da organização e do cuidado com o ambiente e seu filho deve ser totalmente responsável por manter a limpeza em seu próprio espaço. Particularmente, quando seu filho é mais velho e é responsável por fazer suas leituras de forma independente ou o dever de casa, seu espaço de estudo deve ser livre de distrações para potencializar a concentração.
Acolher as crianças na cozinha é uma das maneiras mais fáceis de apoiar a crescente independência delas em casa. Os mantimentos podem ser colocados em prateleiras baixas e fáceis de alcançar, para que o seu filho possa fazer escolhas e recolocar aquilo que utilizar no local correto. Um banquinho colocado perto da bancada convidará a criança a ajudar na lavagem de pratos ou na preparação de alimentos.
A chave da independência para Montessori é incluir as crianças nas atividades diárias da sua família em casa. Na sala de aula, o professor é o adulto preparado. Em casa, é você. Qual é o seu papel no apoio à prática da família Montessori em casa? Quando se trata de implementar os princípios de Montessori em casa, a maioria dos pais fica intrigada com a ideia, por não saber por onde começar. O importante é começar com uma mudança de mentalidade. Como pai, você tem que começar entendendo que as crianças – mesmo as menores- são capazes de realizar mais do que você imagina. Uma vez que você reconhece isso, então você pode fazer algumas mudanças em sua casa para estimular a independência de seu filho.
Organize seu ambiente
“Um lugar para tudo e tudo em seu lugar” é um dos princípios de Montessori. Quando você designa um lugar para tudo, seu filho aprenderá rapidamente o lugar das coisas. Esta é uma ferramenta essencial para ensiná-los a serem responsáveis pelos seus pertences e a limpar as desordens que possam fazer.
Para ordenar efetivamente seu ambiente, a mudança mais significativa que você poderá fazer é tornar as coisas mais acessíveis para seu filho. Para fazer isso, é recomendado que os pais:
- Guardem as roupas em gavetas ou cestas baixas, para que seu filho possa alcançar suas roupas;
- Coloquem banquinhos na cozinha e no banheiro para as crianças lavarem as mãos e, no caso da cozinha, ajudar na preparação das refeições;
- Coloquem brinquedos, jogos e materiais de arte em prateleiras baixas onde seu filho possa acessá-los facilmente, e depois separem esses brinquedos em várias cestas e latas para que os itens fiquem separados e sejam fáceis de encontrar sem procurar em pilhas de outros brinquedos;
- Guardem lanches saudáveis em sua geladeira ou despensa para que seu filho possa se servir;
- Mantenha bebidas em pequenos jarros localizados na prateleira inferior da geladeira, com xícaras próximas. Quando seu filho estiver com sede, permita que ele se sirva (mantenha uma esponja por perto para que a criança possa limpar qualquer desordem que fizer também).
Na abordagem Montessori, os pais também são incentivados a trocar os brinquedos e livros de seus filhos com frequência. O objetivo disso é manter sua curiosidade renovada e evitar o tédio. Isso pode parecer complicado para alguns pais, mas a melhor maneira de fazer isso é ir trocando os itens nas prateleiras com base nos interesses atuais dos filhos. Eles estão animados com os dinossauros? Inclua uma cesta de dinossauros, bem como alguns livros temáticos apropriados para a idade.
Enfatize as habilidades da vida prática
Até as crianças pequenas são capazes de ajudar em casa. Ensinando-os a cuidar de si mesmos e do espaço ao redor deles desde cedo, você permite com que eles se tornem adultos atenciosos e independentes. Isso significa que, como pai ou mãe, você terá que parar e dedicar um tempo para ensinar seu filho a limpar a mesa depois de uma refeição. Mas a mente das crianças é poderosa! Não demora muito para que elas possam realizar tudo que aprenderam de forma independente. Lembre-se de combinar suas tarefas com a idade e habilidades. Por exemplo, as crianças mais novas são perfeitamente capazes de aprender a regar plantas, alimentar animais de estimação, limpar a mesa depois de uma refeição e guardar seus brinquedos. As crianças mais velhas podem realizar tarefas mais complexas em sua rotina, como tirar o lixo, preparar refeições e fazer manutenção básica na casa. Elas também podem ensinar as crianças mais novas em casa também.
Estimule a concentração
Muitos adultos não acham que crianças pequenas conseguem se concentrar, e é verdade que as crianças não podem se concentrar em algo pelo mesmo período de tempo que os adultos. Mas, sob o método de pensamento Montessori, essa é uma habilidade que você pode começar a cultivar em seu filho desde cedo. Você pode ajudar a desenvolver a concentração do seu filho em qualquer idade, observando o que desperta seu interesse e oferecendo oportunidades para aguçá-lo.
Prepare a casa com os objetos para explorar o que despertou interesse e deixe-o trabalhar sem interrupções, até que esteja pronto para escolher outra atividade. A capacidade de se concentrar é uma habilidade importante para o aprendizado. Com base nas suas observações, faça alterações no ambiente para garantir o interesse e independência do seu filho. Para crianças mais velhas, trabalhe em conjunto e inclua-as no processo de tomada de decisão. Dê opções, mas certifique-se de que você está confortável com todas as opções disponíveis, para que você apoie a criança independentemente da escolha.
Foque na motivação interior e não nas recompensas
O método Montessori não se baseia em dar às crianças recompensas extrínsecas por comportamento, como adesivos ou doces. O elogio verbal é valorizado, embora seja importante garantir que seja dado com moderação. A chave é que você deve ensinar seus filhos a desfrutar e buscar os sentimentos de prazer e orgulho que acompanham o aprendizado de algo novo ou a conclusão de uma tarefa.
Montessori baseia-se na crença de que o orgulho e o prazer no próprio trabalho têm efeitos duradouros e significativos que os incentivos externos não têm. Na perspectiva Montessoriana, até mesmo elogios devem ser dados com moderação – salvos para reconhecer o esforço de uma criança e incentivar a dedicação e o comprometimento em realizar uma tarefa, em vez do resultado de seu trabalho. Ao expressar encorajamento e gratidão pelos esforços de seus filhos em casa, você, assim como seus professores, ajudará a nutrir uma motivação interna que os acompanhará ao longo da vida.
CRIANDO UM AMBIENTE MONTESSORI PARA BEBÊS
Para criar um ambiente Montessori não é necessário esperar que seus filhos fiquem mais velhos. É fato que mesmo os bebês respondem bem a um ambiente Montessori em casa. Se você está planejando implementar os princípios Montessoriana no ambiente doméstico do seu bebê, aqui estão quatro coisas que você pode fazer:
- Tampe as tomadas elétricas, coloque fechos de segurança nas portas e remova objetos que possam machucar seu bebê – ou que seu bebê possa se ferir. O objetivo é criar um ambiente que permita que ele se mova e explore o espaço livremente à medida em que começa a se movimentar.
- A maioria das pessoas pensa em portais como formas de restringir seus pequeninos, mas você pode usá-los para delinear seus espaços de lazer e mantê-los nas áreas projetadas para seu aprendizado e exploração.
- Tente colocar um colchão no chão e brinquedos adequados à idade ao seu alcance.
Procure uma cadeira para a criança que seja adaptável à mesa de refeições da família, possibilitando a ela compartilhar com todos o momento das refeições.
CRIANDO UM AMBIENTE MONTESSORI PARA CRIANÇAS
À medida que seu filho cresce e adquire mais mobilidade, é essencial permitir-lhe a liberdade de se movimentar e explorar toda a casa. Nesta fase, as adaptações da casa Montessori terão que se estender para o banheiro, porque a criança vai passar mais tempo lá. É importante incluir um banquinho, extensores de torneira e um extensor de luz – tudo com o objetivo de ensinar seu filho a ser autossuficiente no banheiro.
Conforme as crianças crescem, seu nível de brincadeira também evolui. Para incentivar a exploração do mundo ao seu redor, há várias coisas que você pode fazer, incluindo essas três:
- Coloque uma pequena seleção de livros e brinquedos apropriados para a idade em prateleiras baixas – mas sem brinquedos de plástico. Mantê-los em uma prateleira baixa permitirá que seu bebê alcance qualquer coisa que chame a atenção dele. Coloque cada tipo de brinquedo em uma cesta ou caixote diferente para que eles comecem a aprender que tudo tem um lugar adequado.
- Pendure trabalhos de arte interessantes ao nível dos olhos da criança. Seja uma impressão de um dos grandes artistas ou uma imagem emoldurada que seu filho ou um irmão mais velho desenhou, é uma ótima maneira de estimular sua mente.
A cada estação, monte uma bandeja de itens encontrados ao ar livre para o seu filho tocar e explorar. Quando você inclui seu filho na coleta dos itens do seu quintal, isso se torna outro momento de aprendizado e exploração. Considere algumas dessas ideias sazonais: Primavera: folhas verdes, musgo, flores e plantas variadas, sementes. / Verão: conchas, pequenos barcos, estrelas do mar, flores, frutas, ervas. / Outono: cabaças, maçãs, folhas, bolotas, milho seco, livros sobre o outono. / Inverno: flocos de neve de papel, ramos verdes, globo de neve, fotos de cenas de inverno.
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